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bibilly 's review for:

O Urso e o Rouxinol by Katherine Arden
3.0

3.5? é nessas horas que sinto falta da meia estrela. não há nada necessariamente ruim sobre este livro, apesar de eu só tê-lo lido em primeiro lugar pela versão russa de Hades e Perséfone. ao contrário do que a sinopse e as resenhas que li me fizeram pensar, o ritmo não é chato nem lento, ainda que também não seja frenético: achei envolvente e quase calmante. por outro lado, não há nada aqui sobre o qual ficar obcecada, e boa parte do tempo a história parecia envolta por um pano morno.

a autora se sai muito bem no que se propõe: mesclar uma história coming of age com contos de fadas russos, numa troca de pov constante, variada e eficiente. embora não haja nada de uau sobre a escrita, tudo isso poderia ter dado muito errado, considerando que 1) em geral o que bookstan chama de whimsical e poético eu leio como tosco; 2) não curto contos de fadas; 3) depois de flashbacks e múltiplos pov's o recurso narrativo que mais me desanima é a narração "ao longo dos anos" ou qualquer outra que me deixe numa sala de espera por metade do livro. em vez disso o que encontrei foram personagens interessantes, eventos que se fazem necessários e uma escrita que se assemelha a contos de fadas simplesmente por lembrar a própria ama de leite das crianças contando-lhes histórias na cozinha durante uma noite de inverno.

contudo, ainda prefiro minhas fantasias repletas de tensão e high stakes, com sólida construção de mundo e palpável slow burn. se por um lado neste volume foi tudo uma questão de vida ou morte, convento ou casamento, por outro não senti isso na pele. talvez por Vasya ser muito jovem e sua caracterização como uma Merida russa lhe dar uma dose mais que suficiente de valentia pra passar por tudo isso. mas acho que prefiro uma Arya Stark a uma princesa da disney: ambas podem guardar mágoa, mas a primeira nunca salvaria alguém que é uma clara ameaça a sua família e nem chega a provar o contrário. em matéria de ficção, ódio é sempre mais saboroso que pura resiliência.

quanto à construção de mundo, os espíritos domésticos são fofos e devem sim ser protegidos at all costs (até porque se não o diabo em forma de urso acorda e come a alma de todo mundo), mas respostas enigmáticas a perguntas diretas só para estender o mistério é exatamente o tipo de coisa que me irrita em contos de fadas. também gostei da discussão sobre práticas religiosas e o enfraquecimento dos deuses antigos devido a uma fé temerosa, entretanto a luta interna do padre contra seus desejos foi mais bem descrita que o efeito de suas palavras "hiper eloquentes" nos fiéis.

[próximo parágrafo pode conter spoilers]

mas o que realmente me fez tirar duas estrelas foi o final. ah, a beleza da coragem e do sacrifício humanos, o perigo de uma batalha que permite pausas para despedidas, a conveniência de uma clareira encantada ou de um vilão gigantesco disposto a negociar... porém melhor ainda foi meu Hades russo, que aparentava estar pronto para uma slow burn de dois livros, tascando um beijo na Perséfone do nada; e depois dita Perséfone mandando um I'm not like the other girls para fechar seu arco com chave de ouro. uma sutileza sem tamanho.


ps: fiquei bem desconfortável com o casamento do pai de Vasya com uma moça pouco mais velha que as filhas dele (eu esperava que a madrasta da história tivesse a idade de uma), especificamente com o fato de ele continuar dormindo com a esposa apesar de ela sempre chorar depois. então vai um tw pra estupro, ainda que nada gráfico.